LINGUAGEM MÉDICA
ACALÁSIA, ACALASIA
O termo achalasia, em inglês, foi criado em 1914 por Arthur
Frederick Hertz, atendendo à sugestão de Sir Cooper Perry,
para designar a falta de abertura ou relaxamento de um esfíncter.[1]
Destinado
inicialmente ao esfíncter esofagiano inferior, o conceito de acalásia
estendeu-se posteriormente a outros esfíncteres do tubo digestivo
e de outros órgãos.
Alguns anos mais tarde,
Hertz mudou o seu próprio nome para Hurst, razão pela qual
a teoria por ele estabelecida passou a ser conhecida como teoria da acalásia
de Hurst.
O termo achalasia formou-se
com os elementos gregos a, privado de + khálasis,
relaxamento + sufixo -ia, que exprime qualidade. Do inglês,
achalasia
passou para outros idiomas de cultura, com as adaptações
mórficas e prosódicas de cada língua.
Em português vigora
a regra de que as palavras formadas diretamente do grego com acréscimo
do sufixo -ia, sem trânsito pelo latim, são paroxítonas.
Assim, por exemplo: atonia, cardiopatia, disfagia, ectasia, hiperemia,
patogenia etc.
Chega a ser acaciano dizer
que toda regra admite exceções, principalmente quando se
trata de questões lingüísticas. No caso do sufixo -ia
podemos citar como exceções amnésia, hemácia,
biópsia, autópsia, distócia, osteomalácia e
todas as palavras formadas com o elemento - uro, do grego oúron,
urina, como anúria, colúria, cristalúria, glicosúria,
hematúria, oligúria, poliúria, piúria etc.
Acalásia também
se inclui entre as exceções. Tratando-se de um termo médico
de criação relativamente recente, ainda permanece o desejo
de mantê-lo atrelado à norma, contra a realidade da língua.
Perguntaria: quantos médicos utilizam na linguagem falada a forma
paroxítona?
O que ouvimos em congressos,
em comunicações, em aulas, em conversas, é sempre
a forma proparoxítona -
acalásia. Na linguagem escrita,
todavia, procura-se não contrariar a regra e suprime-se o acento.
Escreve-se acalasia e pronuncia-se acalásia.
Aos que temem contrariar
os guardiães da gramática e da prosódia poderia oferecer
alguns elementos tranqüilizadores.
O grande filólogo
e lingüista Augusto Magne consigna as duas formas: acalásia
e acalasia.[2] De igual modo procede a Academia Brasileira
de Letras, colocando acalásia
em primeiro lugar e acalasia
como
variante.[3] No
Dicionário Escolar da Língua
Portuguesa, editado pelo Ministério da Educação
e Cultura, lê-se: "É corrente e aceita em linguagem médica
a prosódia acalásia".[4]
O Grande Dicionário
da Língua Portuguesa, de Morais Silva, 10. ed., [5]
só averba a forma proparoxítona - acalásia.
Assim também procede a Grande Enciclopédia Portuguesa
e Brasileira, citando como exemplo a "acalásia do cárdia,
uma das formas de megaesôfago".[6]
Outros léxicos contemporâneos,
como o Grande Dicionário Brasileiro Melhoramentos, [7]
e o Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, da
editora Mirador Internacional, [8] ambos organizados
por uma equipe de competentes lingüistas, só registram a forma
acalásia.
O moderno Dicionário de termos técnicos de medicina e
saúde, de Luis Rey, [9] optou igualmente
por acalásia. E até o Dicionário de Rimas
da Língua Portuguesa, de José Augusto Fernandes, rima
acalásia com Eufrásia e eutanásia.[10]
Dos léxicos de maior
expressão, somente o de Silveira Bueno [11],
o de Aurélio Ferreira
[12] e o Michaelis
[13]
adotam
a forma paroxítona
acalasia.
Podem, portanto, os médicos
tranqüilamente escrever acalásia, com acento bem visível
no penúltimo
a, tal como pronunciam.
Referências biliográficas
1. HERTZ, A.F. - Achalasia of the cardia. Quart.
J.
Med.
8: 300-308, 1914/15.
2. MAGNE, A. - Dicionário da língua portuguesa,
A-AL Rio de Janeiro, INL, 1950.
3. ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS: Vocabulário
ortográfico da língua portuguesa, 3. ed. Rio de Janeiro,
Imprensa Nacional, 1999.
4. BUENO, F.S. - Dicionário escolar da língua
portuguesa, 11.ed. Rio de Janeiro, MEC/FENAME, 1980.
5. MORAIS SILVA, A. - Grande dicionário da língua
portuguesa, 10.ed. (12 vol.), Lisboa, Confluência, 1949-1959.
6. GRANDE ENCICLOPÉDIA PORTUGUESA E BRASILEIRA.
Lisboa, Editorial Enciclopédia Ltda., 1935-1958.
7. GRANDE DICIONÁRIO BRASILEIRO MELHORAMENTOS,
8.ed. São Paulo, 1975.
8. DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA
(MIRADOR INTERNACIONAL) 4.ed. São Paulo, Cia. Melhoramentos, 1980.
9. REY, L. - Dicionário de termos técnicos
de medicina e saúde. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan S.A., 1999.
10. FERNANDES, J.A. - Dicionário de rimas da língua
portuguesa. Rio de Janeiro, Ed. Record, 1985, p.100.
11. BUENO, F.S. - Grande dicionário etimológico-prosódico
da língua portuguesa. São Paulo, Ed. Saraiva, 1963.
12. FERREIRA, A.B.H. - Novo dicionário da língua
portuguesa, 3.ed. Rio de Janeiro, Ed. Nova Fronteira, 1999.
13. MICHAELIS: Moderno dicionário da língua
portuguesa. São Paulo, Cia. Melhoramentos, 1998.
Publicado no livro Linguagem Médica, 4a. ed., Goiânia, Ed. Kelps, 2011.
Versão mais completa na revista Estudos, v.33 n. 3/4, Editora da Universidade Católica de Goiás
Joffre M de Rezende
Prof. Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás
e-mail: pedro@jmrezende.com.br
http://www.jmrezende.com.br