LINGUAGEM MÉDICA
DROGA, FÁRMACO,
MEDICAMENTO, REMÉDIO
Os termos acima são
frequentemente empregados com o mesmo significado. São sinônimos?
Droga designava primitivamente
toda substância orgânica ou inorgânica empregada como
ingrediente de tinturaria, química ou farmácia.
As drogas usadas em medicina
eram chamadas drogas medicinais, compreendendo as de origem animal, vegetal
ou mineral. As mais comuns eram as de origem vegetal.
Os árabes manipulavam
com eficiência as drogas medicinais, tendo introduzido ou aperfeiçoado
várias operações químicas, como a filtração,
a evaporação, a destilação.
O termo droga, entretanto,
só começou a ser usado na Idade Média e a sua origem
é controversa.e várias possibilidades têm sido admitidas;
as mais verossímeis são:
1. Do baixo alemão
droghe
vate, expressão que designava o recipiente onde se guardavam
as ervas secas.[1]
2. Do neerlandês droog,
que quer dizer seco.[2]
3. Do céltico, com
a acepção de má qualidade. Falam a favor desta hipótese
os vocábulos droug em bretão, e droch em irlandês.[3]
Qualquer que seja o seu étimo,
o termo droga, de acordo com a maioria dos léxicos, designa
a substância ou matéria da qual se extrai ou com a qual se
prepara determinado medicamento.
Pedro Pinto, professor de
Farmacologia e profundo conhecedor de nosso idioma, assim define droga:
"Farmacógeno. Depois de certa manipulação, ou de manipulações,
se transmuda em medicamento, ou em profármaco.[4]
De droga formou-se
drogaria.
É interessante seguir ao longo do tempo a evolução
semântica de palavra drogaria.
Drogaria significava
inicialmente uma coleção de drogas.[5] De coleção
de drogas passou a designar o local onde se guardavam as drogas e, finalmente,
o comércio de drogas.[6] Atualmente chamamos drogaria ao estabelecimento
comercial onde se vendem medicamentos e outros produtos acabados, como
cosméticos e perfumarias, prontos para serem usados.
Torna-se, assim, compreensível
a mudança de significado que está ocorrendo com a palavra
droga.
Droga também quer
dizer coisa de pouca valia. Esta acepção é bem antiga
em nossa língua, o que traduz, sem dúvida, a sabedoria popular.
No século XX a palavra
droga
ganhou
um novo significado, passando a ser empregada como sinônimo de tóxico.
O verbo drogar e o seu particípio passado,
drogado,
expressam, respectivamente, o uso de tóxicos e o estado decorrente
da ação deste.
O termo fármaco
é a tradução do grego phármakon,
que tanto designa medicamento como veneno, ou seja, qualquer substância
capaz de atuar no organismo, seja em sentido benéfico ou maléfico.
Este duplo sentido demonstra a arguta percepção dos gregos.
Fármaco, como
sinônimo de medicamento, é pouco empregado em linguagem comum,
estando ausente da maioria dos dicionários contemporâneos.
Em linguagem médica tem sido utilizado de preferência com
sentido restrito, para designar uma substância única, orgânica
ou inorgânica, de composição conhecida. Nesta acepção
não pode ser considerado sinônimo de medicamento.
De phármakon derivam
várias palavras, tais como farmacologia, farmacognosia, armacotécnica,
farmacodinâmica, farmacopéia, farmacoquímica
e
muitas outras. Farmácia veio do grego pharmakía,
através do latim pharmacia. Significava originalmente
a arte de preparar medicamentos e, por extensão, passou a designar
os estabelecimentos onde se preparam e se vendem medicamentos. Em sua grande
maioria são estabelecimentos comerciais em tudo semelhantes às
drogarias, das quais se distinguem apenas por serem de menor porte.
Medicamento provém
do latim medicamentum, vocábulo que tem o mesmo tema
de médico, medicina, medicar, etc., e que se liga ao verbo medeor,
que significa cuidar de, proteger, tratar. Medicamentum,
em latim, tinha também o sentido de beberagem mágica, bruxaria,
feitiço.[7]
Remédio provém
do latim remedium, aquilo que cura. Remédio e medicamento
também não são sinônimos perfeitos. "Remédio
tem um sentido mais amplo que medicamento. O remédio compreende
tudo que é empregado para a cura de uma doença... O exercício
pode ser um remédio, porém nunca é um medicamento".[6]
"Remédio é termo mais extensivo que medicamento, é
o gênero de que este é a espécie".[8]
Remédio é
termo de uso predominantemente popular e literário, pouco empregado
em linguagem científica.
Terminando estas considerações
podemos concluir que cada um dos termos assinalados possui significado
próprio e só de modo genérico podem ser considerados
equivalentes. Percebe-se, contudo, nos textos médicos atuais, uma
clara tendência de conferir à palavra droga o mesmo
significado de fármaco, sobretudo quando se trata de substância
química sintetizada pela indústria farmacêutica.
Referências bibliográficas
1. SKINNER, H.A. - The origin of medical terms, 2.ed.
Baltimore, Williams & Wilkins, 1961, p. 146
2. BLOCH, O.,VON WARTBURG, W. - Dictionnaire étymologique
de la langue française, 7.ed. Paris, Presses Universitaires de France,
1986.
3. COROMINAS, J. - Breve diccionario etimológico
de la lengua castellana, 3.ed., Madrid, Ed. Gredos, 1980.
4. PINTO, P. A. - Dicionário de termos farmacêuticos.
Rio de Janeiro, Ed. Científica, 1959.
5. MORAES SILVA, A. - Dicionário da língua
portuguesa. Lisboa, 2.ed. Typographia Lacerdina, 1813.
6. VIEIRA, D. - Grande dicionário português
ou Tesouro da língua portuguesa. Porto, Ernesto Chardron e Bartholomeu
H. de Moraes, 1871-1874.
7. SARAIVA, F.R.S. - Dicionario latino-português,
10.ed. Rio de Janeiro, Liv. Garnier, 1993.
8. LACERDA, J.M.A.A.C. - Dicionário enciclopédico
ou Novo dicionário da língua portuguesa. Lisboa, F. Arthur
da Silva, 1874.
Publicado no livro Linguagem Médica, 3a. ed., Goiânia, AB Editora
e Distribuidora de Livros Ltda, 2004..
Joffre M de Rezende
Prof. Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal
de Goiás
Membro da Sociedade Brasileira de História
da Medicina
e-mail: pedro@jmrezende.com.br
http://www.jmrezende.com.br
10/9/2004.