LINGUAGEM MÉDICA

SOMATÓRIO, SOMATÓRIA

        Etimologicamente, a palavra somatório (a) formou-se do particípio do verbo somar, somado, com apócope da vogal final, substituição da letra d por t e acréscimo do sufixo ório.[1] Este sufixo forma tanto substantivos como adjetivos [2], conferindo à palavra o sentido de:

        1. lugar: consultório, dormitório, refeitório;
        2. ação: mandatório, obrigatório, operatório;
        3. coleção: fuguetório, papelório, somatório;
        4. atributo: giratório, secretório, antiinflamatório;
        5. depreciação: finório. palavrório, simplório.

        Somatório, como substantivo, enquadra-se, portanto, entre os termos que exprimem coleção, adição de partes, a totalidade. Em matemática, define-se como a soma das somas, cada uma das quais passa a ser uma parcela da soma geral. É representado pela letra grega maiúscula sigma. [1]. Como adjetivo é averbado nos léxicos como "indicativo de soma".

        O termo somatório foi introduzido na língua portuguesa no final do século XIX [3] e incorporado ao léxico pelos dicionários do século XX (Simões da Fonseca, 1926; Nascentes, 1932; C. Figueiredo, 1949; Laudelino Freire, 1957; Silveira Bueno, 1963; Melhoramentos, 1975; Aulete-Garcia, 1980).

        Somatória, feminino de somatório e com idêntico significado, é de uso mais recente e nem mesmo os dicionários mais modernos (Michaelis, 1998; Aurélio séc. XXI, 1999; Houaiss, 2001; Academia das Ciências de Lisboa, 2001) o registram. De todos os léxicos consultados, o único com o verbete somatória é o Dicionário de usos do português do Brasil, de Francisco Borba, editado em 2002 [4].

        A forma feminina, no entanto, é de uso frequente. Em uma pesquisa na Internet, realizada em 27/05/2006, somatório, em português, contava 735.000 ocorrências e somatória 231.000, o que dá uma proporção de 3,2:1.[5]

        Na literatura médica indexada pela BIREME, até aquela mesma data, havia 61 artigos em que os autores usaram a palavra somatório e 54 em que foi usada a variante somatória, ou seja uma proporção de 1,1:1. [6]

        Estes dados sugerem que o gênero feminino está sendo mais empregado na linguagem médica do que na linguagem em geral.

        Por que teria surgido a variante somatória no gênero feminino, se a palavra somatório já estava consagrada pelo uso? A hipótese mais plausível seria a de que, na percepção intuitiva dos usuários, sendo soma do gênero feminino, a soma das somas também deveria ser do mesmo gênero.

        A pergunta final, obviamente, é: qual a forma que se deve usar? Entendo que, enquanto a forma somatória não for incorporada ao acervo lexical dos melhores dicionários, é preferível a opção por somatório.

Referências bibliográficas

1.HOUAISS, A.., VILLAR, M.S. - Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro, Objetiva, 2001.
2. GOES, C. - Dicionário de afixos e desinências, 3.ed. Liv. Francisco Alves, 1937.
3. MACHADO, J.P. - Dicionário etimológico da língua portuguesa, 3.ed. Lisboa, Livros Horizonte, 1977.
4. BORBA, F.S. – Dicionário de usos do português do Brasil. São Paulo, Editora Ática, 2002.
5. INTERNET - Disponível em http://www.google.com.br/ . Acesso em 26/05/2006
6. INTERNET - BIREME. Disponível em http://www.bireme.br/ . Acesso em 26/05/2006   


Joffre M de Rezende
Prof. Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás
Membro da Sociedade Brasileira de História da Medicina
e-mail: pedro@jmrezende.com.br
http://www.jmrezende.com.br

28/05/2006