UMBIGO, UMBILICAL
A palavra umbigo tem
sua origem no latim umbilicus, diminutivo de umbo, com o
sentido de saliência arredondada em uma superfície.
Umbo, onis, por
sua vez, provém do indo-europeu ombh, de onde também
procede o termo grego
omphalós, com o qual se formaram todos
os compostos de uso corrente em linguagem médica, relativos a umbigo,
como onfalite, onfalocele, onfalorragia, onfalotomia, onfalotripsia, etc.
De uma variante de ombh no indo-europeu, nobh,
derivam
o alemão
nabil e o inglês navel, indicativos
de umbigo.[1][2]
É digno de nota o
fato de que uma palavra cujo significado primitivo era de elevação,
proeminência, tenha evoluído semanticamente para designar
uma depressão anatômica como a cicatriz umbilical.
A evolução
do latim umbilicus
para as línguas românicas
fez-se de modo muito variável, até se fixar nas formas atuais.
É comum a existência de mais de uma forma na mesma língua.
Assim, em italiano temos bellico, ombelico e umbilico; em
francês, nombil e ombilic; em português, embigo,
imbigo e umbigo. Em espanhol prevaleceu a forma castelhana ombligo,
porém
em outras línguas hispânicas, como o catalão e o aragonês,
encontram-se nomes populares como melico e meligo.[3]
Em português, as variantes
embigo
e
imbigo formaram-se através do latim vulgar e ainda sobrevivem
na linguagem popular. A forma umbigo é considerada erudita
ou semi-erudita.[4]
Nos clássicos da
antigüidade a mesma palavra designava tanto o local de inserção
do cordão umbilical, como o próprio cordão. Na Ilíada,
Homero usou omphalós para indicar a cicatriz umbilical.
Assim também Heródoto, em seu livro sétimo - Polimnia.[5]
Hipócrates, Sorano
e Galeno, contudo, empregaram
omphalós para nomear o cordão
umbilical.[6]
Do mesmo modo, Celsus referiu-se
a umbilicus com o sentido de cordão umbilical, como se lê
na seguinte passagem: medicus deinde sinistra manu leniter trahere
umbilicum debet ita ne abruptam (o médico com sua mão
esquerda deve tracionar gentilmente o umbigo para este não se romper).[7]
A Nomina Anatomica
de 1955 (PNA) adotou dupla definição para umbilicus:
antes do nascimento é a região de passagem dos órgãos
que ligam o feto à mãe; após o nascimento, a cicatriz
decorrente da queda do cordão umbilical.[8]
O umbigo sempre teve um
significado especial na mente do homem por representar o elo biológico
que liga a mãe ao filho e expressar a relação de dependência
entre uma vida e outra. No subconsciente, o umbigo simboliza a vinculação
do ser com o mundo exterior e identifica-se com o centro do corpo.
Na mitologia grega, o centro
do mundo localizava-se no templo de Apolo, em Delfos, e era assinalado
por uma escultura de mármore, de forma cilíndrica e extremidade
superior arredondada, a que se denominava omphalós. Junto
dela, a pitonisa proferia seus oráculos sob o influxo de vapores
emanados de uma fonte da rocha e que se acreditava proviessem do interior
da Terra.[9][10] Era a mãe-Terra ligando-se pelo umbigo aos filhos
inseguros e temerosos que ali compareciam.
Na atualidade, três outros locais são referidos como umbigo do mundo.
São eles a ilha da Páscoa, no oceano pacífico,
famosa pelas misteriosas estátuas gigantes de pedra, denominadas
moais; Machu-pichu, centro da
civilização inca no Peru, e Mirna, na Sibéria,
onde foi feita a maior excavação em busca de diamante,
resultando em um buraco de 525 metros de profundidade e um
diâmetro de 1.025 metros.
Desde os clássicos
latinos, umbilicus designa também o meio, o ponto central
de alguma coisa e, nesse sentido, são inúmeras as acepções
do vocábulo que se transferiram a outras línguas.
Em latim, o adjetivo correspondente
a umbilicus é umbilicaris,[11] que se traduz em português
por umbilical,
sendo errônea a forma umbelical.
Referências bibliográficas
1. ERNOUT, A. & MEILLET, A.- Dictionnaire étymologique
de la langue latine. Histoire des mots, 4.ed. Paris, Ed. Klincksieck, 1979.
2. WATKINS, C. - Indo-european roots. In MORRIS,
W. (Ed.): The american heritage dictionary of the english-language. Boston,
Houghton Mifflin Co., 1981, p. 1531
3. COROMINAS, J., PASCUAL, J.A. - Diccionario crítico
etimológico castellano e hispánico. Madrid, Ed. Gredos, 1984.
4. WILLIAMS, E.B. - Do latim ao português. Rio
de Janeiro, INL, 1961, p. 58
5. HERODOTUS - Book VII. The Loeb Classical Library.
Cambridge, Harvard Univesity Press, 1982, p. 374
6. LIDDELL, H.G., SCOTT, R. - A greek-english lexicon,
9.ed., Oxford, Claredon Press, 1983.
7. CELSUS, A.C. - De Medicina. The Loeb Classical Library,
Cambridge, Harvard University Press, 1971, vol. 3, p. 460
8. MANUILA, A., MANUILA, L., NICOLE, M. & LAMBERT,
H. Dictionnaire français de médecine et de biologie. Paris,
Masson & Cie., 1970.
9. HAMILTON, E. - A mitologia, Lisboa, Dom Quixote, 1983,
p. 37
10. LYONS, A.S., PETRUCELLI, R.J.II - Medicine. An illustrated
history. New York, Harry N. Abrams, Inc., Publ., 1978, p. 182
11. SARAIVA, F.R.S. - Dicionario latino-português,
9.ed. Rio de Janeiro, Liv. Garnier, 1993.
Publicado no livro Linguagem Médica, 3a. ed., Goiânia, AB Editora
e Distribuidora de Livros Ltda, 2004..
Joffre M de Rezende
Prof. Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal
de Goiás
Membro da Sociedade Brasileira de História
da Medicina
e-mail: pedro@jmrezende.com.br
http://www.jmrezende.com.br
12/05/2006.