NEMATÓIDES, NEMATÓDEOS, NEMATODES, NEMATODOS
Na nomenclatura zoológica,
a classe Nematoda (Rudolphi, 1808) reúne os helmintos de
corpo cilíndrico, fino e alongado, de vida livre ou endoparasitos.
Pertencem a esta classe os enteroparasitos humanos mais comuns, como Ascaris
lumbricoides, Ancylostoma duodenale, Necator americanus, Strongyloides
stercoralis, Enterobius vermicularis, Trichocephalus trichiurus etc.
Nematoda é
o plural neutro em latim correspondente à nematodes, palavra
que já existia em grego, formada de Nema, atos, fio +
sufixo -odes,
que tem o sentido de "à maneira de", "desta
maneira", "semelhante a".1,2
A palavra nematóide
surgiu
em data posterior nas línguas ocidentais, formada do mesmo tema,
acrescido do sufixo -óide, do grego -eidos, que expressa
"forma", "aspecto", "semelhança". Nematóide, inicialmente
adjetivo, foi substantivado, convertendo-se em forma paralela a nematodes.
Não sabemos se Rudolphi,
ao nomear esta classe de helmintos, tinha em mente a palavra grega já
existente ou o composto formado com o sufixo -eidos.
Em inglês, usa-se
nematoda
para designar a classe e nematodes para os helmintos pertencentes
à mesma.3,4,5
Em francês prevalece
a forma nematodes, porém dão a palavra como tendo
sido formada com o prefixo -eidos.6 O dicionário
de Manuila e col. averbam nematodes para o que consideram "ordem"
de helmintos, em lugar de classe, e nematóide apenas como
adjetivo, com a definição de "semelhante ao verme."7
Em espanhol, a preferência
absoluta é para nematodo, não se empregando nematoide
a não ser muito raramente como adjetivo.
Em português, percorrendo
os nossos léxicos, verificamos haver diferentes interpretações
e posicionamentos em relação aos termos de que nos ocupamos.
Começando pelos dicionários
médicos, Ramiz Galvão, em seu clássico Vocabulário
das palavras derivadas da língua grega, propõe nematóideos
para a classe de helmintos e define nematóide como adjetivo,
"que tem a forma de fio".8
Pedro Pinto segue Ramiz
Galvão, substituindo a terminação -ideos por
-idios
-
nematóidios.9
Céu Coutinho mantém
nematoda
para
a classe e nemátodos para os parasitos. Averba nematóide
como
adjetivo, "semelhante a um fio ou referente a um parasita nemátodo".10
Paciornik averba nematóides
para
a classe e nematóide para o verme.11
Luis Rey mantém nematoda
para
a classe e nematóides para os helmintos, dando como sinônimo
nematódeos.12
Os dicionários não
especializados da língua portuguesa divergem entre si quanto aos
termos averbados e nos apresentam um leque de opções, como
veremos a seguir.
1. Silveira Bueno (1963)
averba nemátodes como substantivo e nematóide
como adjetivo.13
2. Antenor Nascentes (1966)
adota nematódios como substantivo e nematóide como
adjetivo.14
3. José Pedro Machado
(1977) consigna apenas nematóide como adjetivo.15
4. Caldas Aulete-Hamilcar
de Garcia (1980) registram nematóide como substantivo e adjetivo.16
5. O dicionário MICHAELIS
(1998) averba nematódeos e nematóides para
a classe e nematóide como adjetivo
e substantivo, tendo por sinônimos nematóideo e
nematódeo.17
6. Aurélio (1999)
designa a classe por nematódeos, o helminto por nematódeo
e atribui a nematóide somente
função adjetiva: "semelhante ao fio de linha" ou "pertencente
ao verme".18
7. Houaiss-Villar (2001)
registram como substantivos nematódeos e nematóides,
considerando
nematóides
a
forma menos correta, embora mais usada.19
8. A Academia das Ciências
de Lisboa (2001) utiliza nematodes como substantivo e nematode
como
adjetivo.20
No referente à etimologia,
indicam como fonte a palavra original grega nematodes, formada do
radical nema, atos + sufixo odes, Barnhart5, Nascentes13
e
a Academia das Ciências de Lisboa20. Os demais léxicos
mencionam o sufixo grego -eidos na etimologia de todas as formas
substantivas ou adjetivas.
A forma nematódeos
resultou do acréscimo à palavra grega do sufixo latino eo(s),
com a noção de relação, semelhança.21
Na literatura médica
em português as duas formas mais usadas como substantivos são
nematóides
e
nematódeos. Na base de dados LILACS da BIREME encontra-se
nos artigos indexados a ocorrência de nematóides 348
vezes (60,7%) e nematódeos 225 vezes (39,3%), o que dá
uma proporção de 1,5:1.22
Apesar disso, e em que pese
à opção do grande parasitologista brasileiro, que
foi Samuel Pessoa23, compartilhamos do parecer exarado no dicionário
Houaiss, de que a forma nematódeos é preferível
a de nematóides. Nematódeos é a própria
palavra grega latinizada pelo sufixo eo(s). Nematóidedeve
ser empregado apenas como adjetivo, seja por comparação a
um fio fino, seja ao próprio verme. Acresce mencionar que nematóide
é
também um termo de Botânica.14
Referências bibliográficas
1. PEREIRA, I. - Dicionário Grego-Português
e Português-Grego, 7. ed. Braga, Liv. Apostolado da Imprensa, 1990.
2. BAILLY, A. - Dictionnaire grec-français, 16.
ed. Paris, Lib. Hachette, 1950.
3. DORLAND'S ILLUSTRATED MEDICAL
DICTIONARY, 28thed. Philadelphia, W.B.Saunders Co., 1994.
4. CHURCHILL'S ILLUSTRATED MEDICAL DICTIONARY - New York,
Churchill Livingstone Inc., 1989.
5. BARNHART, R.K. - Chambers dictionary of etymology.
New York, Chambers, 2001.
6. ROBERT, P. - Dictionnaire alphabétique et analogique
de la langue française. Paris, Dictionnaires Le Robert, 1987.
7. MANUILA, A. et al. Dictionnaire français de
médecine et de biologie. Paris, Masson Cie., 1970.
8. RAMIZ GALVÃO,
B.F. - Vocabulário etymologico, ortographico e prosodico das palavras
portuguesas derivadas da língua grega. Rio de Janeiro, Liv. Francisco
Alves, 1909.
9. PINTO, Pedro A. - Dicionário de termos médicos,
8. ed. Rio de Janeiro, Ed. Científica, 1962.
10. PACIORNIK, Rodolpho - Dicionário médico,
2.ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 1975.
11 COUTINHO, A. Céu - Dicionário enciclopédico
de medicina, 3.ed. Lisboa, Argo Ed., 1977.
12. REY, L. Dicionário de termos técnicos
de medicina e saúde, 2. ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan S.A.,
1999.
13. BUENO, F.S. - Grande dicionário etimológico-prosódico
da língua portuguesa. São Paulo, Ed. Saraiva, 1963.
14. NASCENTES, A. - Dicionário da língua
portuguesa. Rio de Janeiro. Academia Brasileira de Letras, 1961-1967.
15. MACHADO, J.P. - Dicionário etimológico
da língua portuguesa, 3.ed. Lisboa, Livros Horizonte, 1977.
16. AULETE, F.J.C., GARCIA, H. - Dicionário contemporâneo
da língua portuguesa, 3.ed. Rio de Janeiro, Ed. Delta, 1980.
17. MICHAELIS - Moderno dicionário da língua
portuguesa. São Paulo, Cia. Melhoramentos, 1998.
18. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda - Novo
dicionário da língua portuguesa, 3.ed. Rio de Janeiro, Ed.
Nova Fronteira, 1999.
19. HOUAISS, A.-VILLAR, M. S. – Dicionário Houaiss
da língua portuguesa. Rio de Janeiro, Objetiva, 2001.
20. ACADEMIA DAS CIÊNCIAS DE LISBOA - Dicionário
da língua portuguesa contemporânea. Lisboa, Ed. Verbo, 2001.
21. CUNHA, Antônio Geraldo da – Dicionário
etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro,
Ed. Nova Fronteira S.A., 1986.
22. BIREME. Internet. Disponível em http://www.bireme.br/php/index.php.
Consulta em 18/8/2007.
23. PESSOA, S. B. - Parasitologia médica, 9.ed.
Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 1974, p.573.
Publicado na Revista de Patologia Tropical 36(3): 269-271, 2007
Joffre M. de Rezende
e-mail: pedro@jmrezende.com.br
http://www.jmrezende.com.br
20/08/2007