A operação
cesariana na antiguidade só era praticada após a morte
da parturiente, com a finalidade de salvar o feto ainda com vida. Desde
700 a.C. a lei romana proibia os funerais de toda gestante morta, antes
que se fizesse a cesárea para retirada do feto. Os fetos que nasciam
com vida eram chamados cesões ou césares.1
A cesárea em vida,
como alternativa de parturição, é bem mais recente.
É interessante conhecer
a história da primeira cesárea em vida de que se tem notícia..
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Foi a mesma realizada em
1500, em Sigershaufen, pequena cidade da Suíça, por Jacob
Nufer, em sua própria esposa. Jacob Nufer não era médico
e nem sequer cirurgião-barbeiro. Era um homem simples do povo, habituado
a castrar porcas.
Sua mulher, primípara,
entrou em trabalho de parto e, como era de hábito na época,
estava sendo atendida por parteira. Por alguma razão, a criança
não nascia. Desesperado, o marido chamou uma a uma, todas as parteiras
do lugar, em número de 13. Depois de muitas tentativas e de longa
espera, vendo que as forças de sua esposa se exauriam, apelou para
os cirurgiões-barbeiros do lugar, acostumados a praticar a talha
hipogástrica para retirada de cálculo vesical, a fim de que
fizessem a operação cesariana em sua esposa.
A simples idéia de
um cirurgião-barbeiro atender a uma parturiente já constituía
um fato inédito que contrariava todos os costumes da época.
Nenhum deles atreveu-se a prestar socorro à infeliz mulher.
Nufer decidiu, então,
solicitar permissão às autoridades civis da cidade para praticar,
ele mesmo, a operação cesariana em sua esposa.
Auxiliado por duas parteiras
mais corajosas, colocou sua mulher sobre uma mesa e com uma navalha abriu-lhe
o ventre. Diz a crônica que o fez com tal habilidade que a criança
foi removida de um só vez, sem provocar qualquer dano à
mãe ou no filho.
As outras onze parteiras
que aguardavam do lado de fora, ao ouvirem o choro da criança, quiseram
entrar, no que foram impedidas, até que Nufer procedesse ao fechamento
da incisão, tal como fazia com as porcas que ele castrava.
Houve cicatrização
da ferida e a parturiente recuperou-se integralmente, tendo tido no decorrer
de sua vida outras cinco gestações, com partos normais, um
dos quais gemelar. A criança, que resistira à ação
de 13 parteiras e à intervenção cirúrgica,
teve desenvolvimento normal e viveu 77anos.
A introdução
da cesárea na prática obstétrica só teve início
a partir do século XVIII. Tinha uma alta mortalidade fetal e materna
e só era praticada em casos muito especiais. Langaard, em seu Dicionário
de Medicina Doméstica e Popular (1873) dá-nos o seu testemunho:
"Apesar de que não se pode admitir que a operação
seja absolutamente mortal, é o numero das operadas que escapam muito
limitado" 3. A preferência dos obstetras era para o uso
do fórceps ou, se necessário, a embriotomia. Somente no século
XX a cesárea tornou-se uma operação rotineira.
Referências bibliográficas
1. VIEIRA, D. - Grande dicionário portuguez ou Tesouro
da língua portugueza. Porto, Ernesto Chardron e Bartholomeu H. de
Moraes, 1871-1874.
2. GRAHAM, H. Surgeons all, New York, Philosophical Library,
1957.
3. LANGGAARD, T. J. H. Diccionario de medicina domestica e popular,
Rio de Janeiro, Eduardo & Henrique Laemmert, 1873
Joffre M de Rezende
Prof. Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade
Federal de Goiás
Membro da Sociedade Brasileira de História da Medicina
e-mail: pedro@jmrezende.com.br
http://www.jmrezende.com.br