INTERVIR COMO SINÔNIMO DE OPERAR
Usa-se correntemente no vocabulário
médico
intervenção
como sinônimo de operação.
Esta
acepção não aparece nos dicionários mais antigos
da língua portuguesa, porém se encontra nos melhores léxicos
contemporâneos.
Aos substantivos operação
e
intervenção
correspondem,
respectivamente, os verbos
operar e intervir. O verbo operar
é transitivo direto (o cirurgião operou o doente) e
também intransitivo
(este cirurgião opera bem). Diversamente,
o verbo intervir é transitivo indireto e pede complemento
com a preposição em (o cirurgião vai intervir no
[em
o] paciente). É ainda usado como intransitivo para expressar
uma intercorrência não esperada
(interveio a febre).
É incorreto usar-se
o verbo intervir com objeto direto (o cirurgião vai intervir
o paciente). Também não se deve usar a voz passiva
(o
paciente foi intervindo ontem), que é própria dos verbos
transitivos diretos. "A voz passiva repugna aos verbos transitivos
indiretos", ensina Machado Filho.[1] No dizer do mestre Mário Barreto
"a construção passiva é, as mais das vezes, pedra
de tocar para comprovar o caráter transitivo do verbo".[2] Citam-se
raras exceções de verbos intransitivos ou transitivos indiretos
que aceitam a voz passiva, como
aludir, apelar, obedecer, perdoar, responder.
O eminente cirurgião
Prof. Ruy Ferreira Santos chamou-nos a atenção para a maneira
incorreta com que, às vezes, se emprega entre nós o verbo
intervir,
e observou que médicos de fala castelhana de países sul-americanos,
provavelmente por equívoco, usam a voz passiva com o verbo intervenir
(el
enfermo ha sido intervenido), o que não deve servir de exemplo
para o nosso idioma.[3]
Outra confusão que
deve ser evitada é a referente à conjugação
do verbo intervir, cujo paradigma é o verbo vir e
não ver. Assim, para exemplificar, temos na primeira pessoa
do singular: intervenho, intervinha, intervim, interviera, intervirei,
interviria, intervenha, interviesse, intervier. O gerúndio e
o particípio são iguais:
intervindo.
Por conseguinte, são
incorretas as construções abaixo indicadas:
"Eu intervi nestepaciente".
"Ele interviu
naquele paciente".
"Se o cirurgião
intervisse
atempo...".
As terminações -vi, -viu, -visse são próprias do verbo ver e seus derivados e não do verbo vir. Deve dizer-se, portanto:
"Eu intervim neste paciente".
"Ele interveio
neste paciente"
"Se o cirurgião
interviesse
a tempo...".
Também é errôneo
dizer: "Se ocirurgião houvesse intervido a tempo..."
O particípio passado do verbo intervir é igual ao
gerúndio - intervindo - e não intervido.
Na dúvida, o melhor
mesmo, para não errar, é usar o verbo operar - operei,
operou,
operasse,
operado.
Referências bibliográficas
1. MACHADO FILHO, A. M. - Coleção "Escrever
Certo", 2.ed., vol. 2. São Paulo, Boa Leitura Ed., 1966, p. 94.
2. BARRETO, M. - De gramática e de linguagem,
3.ed. fac-similar. Rio de Janeiro, INL-Presença, 1982, p.324.
3. FERREIRA-SANTOS, R. Comunicação pessoal.
Publicado no livro Linguagem Médica, 3a. ed., Goiânia, AB Editora
e Distribuidora de Livros Ltda, 2004..
Joffre M de Rezende
Prof. Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal
de Goiás
Membro da Sociedade Brasileira de História
da Medicina
e-mail: pedro@jmrezende.com.br
http://www.jmrezende.com.br
10/9/2004.