SÍNDROME
Syndromé,
como
palavra grega, é substantivo proparoxítono, do gênero
feminino, e significa "ação de concorrer, concurso". Em grego
existe ainda o adjetivo syndromos, as (dois gêneros),
significando "que correm juntos, que acompanham".
Segundo Littré, o
termo fora empregado pelos antigos médicos gregos para indicar um
conjunto de sintomas sem relação obrigatória com determinada
doença.[1] Embora na coleção de livros atribuídos
à escola hipocrática tenham sido descritas diversas síndromes,
não há, na mesma, qualquer referência específica
ao termo síndrome,[2] o qual só aparece nas obras de Galeno
e de Areteus.[3]
Em inglês, a palavra
síndrome entrou para o vocabulário médico em 1541,
em uma tradução das obras de Galeno.[4]
Em francês, a palavra
síndrome
conservou a grafia original, porém tornou-se paroxítona de
acordo com a prosódia francesa. Em espanhol e italiano manteve-se
a tonicidade da antepenúltima sílaba. Em português
surgiram nada menos que cinco formas: síndrome, síndromo,
sindromo, síndroma e sindroma.
Muito se tem escrito sobre
a palavra síndrome e suas variantes, havendo divergências
quanto à legitimidade de uma ou outra forma.
No livro do Prof. Idel Becker,
Nomenclatura
Biomédica no Idioma Português do Brasil, o assunto mereceu
comentário especial, acompanhado da transcrição de
três estudos sobre a questão; um de Miguel Couto, quem advogava
síndromo;
outro
do helenista português José Inez Louro, admitindo tanto síndroma
como síndromo, e, finalmente, o de Ezechias da Rocha,
autor de uma tese sobre o assunto, defendida na Faculdade de Medicina da
Bahia em 1921, propugnando a forma síndrome[5]
Os que advogam síndromo,
como
Pedro Antonio Basílio e Miguel Couto, baseiam-se na similitude de
palavras análogas, como pródromo, hipódromo, aeródromo.[6]
A forma síndroma
torna-se
facilmente defensável se considerarmos que as palavras gregas da
primeira declinação, com nominativo em e passam
para o português com a terminação em a.
Ex.: aorta, amígdala, biblioteca, técnica, etc.
A forma síndrome
é
aceita principalmente por achar-se consagrada na literatura médica
e por melhor atender ao ideal de unidade lingüística internacional,
tratando-se de linguagem médica.
Pedro Pinto, que adota síndrome,
argumenta ainda que se trata de termo restrito à medicina e não
há porque compará-lo a outros da linguagem geral.[7]
A forma sindroma,
com acentuação na penúltima sílaba, conforme
ressaltou Ramiz Galvão, decorre de um equívoco. "O fato de
haver em medicina muitos vocábulos em oma, paroxítonos,
por virem de substantivos neutros em oma, omatós,
induziu a erro os nossos cientistas. Aqui a etimologia está mostrando
que o correto é a síndrome, ou quando muito a síndroma".[8]
Outra dúvida diz
respeito ao gênero, ora masculino, ora feminino. Feminino em sua
língua de origem, tornou-se masculino em espanhol, feminino em italiano
e de gênero incerto em francês. Em português observa-se
igualmente certa vacilação quanto ao gênero da palavra
síndrome (ou síndroma).
Rui Barbosa, na Réplica,
usou o síndroma.[9] Francisco de Castro, médico e
professor eminente, profundo conhecedor da língua vernácula,
também escrevia o síndroma.[10] Já Aloysio
de Castro, em seu clássico Tratado de Semiótica
Nervosa optou por a sindroma.[11]
Nota-se maior indecisão,
quanto ao gênero, por parte dos lexicógrafos. Cândido
de Figueiredo consigna os dois gêneros para síndrome, feminino
para síndroma e masculino para síndromo.[12]
O dicionário de Aulete-Garcia coloca síndrome no gênero
feminino, síndromo no masculino e admite os dois gêneros
para síndroma, advertindo que o uso do masculino no caso
de síndroma se deu por influência de sintoma.[13]
Silveira Bueno registra unicamente as formas síndroma e
síndrome,
ambas no gênero feminino. Assinala no verbete
síndroma
que
"alguns lhe deram o gênero masculino, levados pela regra de que os
nomes gregos terminados em ma são masculinos, como problema, dilema,
cinema, etc. Mas esta palavra não termina em grego em ma
sim
em me".[14]
No Vocabulário
Ortográfico da Academia Brasileira de Letras encontramos as
três formas: síndromo no gênero masculino, síndroma
e
síndrome
no
gênero feminino.[15]
A tendência dos dicionários
modernos , como o de Aurélio Ferreira e o de Houaiss é de
registrar apenas as formas síndrome e síndroma,
ambas no feminino.[16][17]
A forma a síndrome
(gênero
feminino, acento tônico na primeira sílaba e final em e)
goza da preferência absoluta da classe médica brasileira.
Dentre 421 trabalhos indexados no período de 15 anos (1965-1980)
há apenas 11 com a palavra síndrome no gênero masculino;
um com a forma o síndromo e nenhum com a terminação
em a (síndroma ou sindroma).[18][19] Nos últimos
20 anos, foram indexados pela BIREME 5.718 artigos com a palavra síndrome
no título, dois com a forma síndroma e nenhum com a forma
síndromo. Este levantamento demonstra que a forma a síndrome
está
plenamente vitoriosa na linguagem médica.[20]
A sugestão final
é de que se adote em definitivo a forma a síndrome, proscrevendo-se
as demais.
Referências bibliográficas
1. LITTRÉ, E. - Dictionnaire de médecine,
de chirurgie, de pharmacie et l'art vétérinaire et des sciences
qui s'y rapportent, 18. ed. Paris, Librarie J.-B. Baillière et Fils,
1898.
2. BOCCANERA NETO, S. - Sýndrome, sýndroma,
ou sýndromo?
Rev. de Língua Portuguesa 17:59-70, 1922
3. LIDDELL, H.G., SCOTT, R. - A greek-english lexicon,
9.ed., Oxford, Claredon Press, 1983.
4. SKINNER, H.A. - The origin of medical terms, 2.ed.
Baltimore, Williams & Wilkins, 1961, p. 395.
5. BECKER, I. - Nomenclatura biomédica no idioma
português do Brasil. São Paulo, Liv. Nobel, 1968, p. 291-313.
6. RIBEIRO, L. - Vocabulário médico. Folha
médica 21: 245-249, 1942.
7. PINTO, P.A - Dicionário de termos médicos,
8. ed. Rio de Janeiro, Ed. Científica, 1962.
8. GALVÃO, B.F.R. - Vocabulário etymologico,
ortographico e prosodico das palavras portuguesas derivadas da língua
grega. Rio de Janeiro, Liv. Francisco Alves, 1909.
9. BARBOSA, R. - Obras completas. Réplica, par.
223. Rio de Janeiro, MEC, 1953.
10. CASTRO, F. - Tractado de clinica propedeutica. Rio
de Janeiro, Laemmert & Cia. Ed., 1896, p. 239.
11. CASTRO, A. - Tratado de semiótica nervosa.
Rio de Janeiro, F. Briguiet & Cia., 1914.
12. FIGUEIREDO, C. - Dicionário da língua
portuguesa, 13.ed. Lisboa, Liv. Bertrand, 1949.
13. AULETE, F.J.C., GARCIA, H. = Dicionário contemporâneo
da língua portuguesa, 3.ed. Rio de Janeiro, Ed. Delta, 1980.
14. BUENO, F.S. - Grande dicionário etimológico-prosódico
da língua portuguesa. São Paulo, Ed. Saraiva, 1963.
15. ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS - Vocabulário
ortográfico da língua portuguesa, 3a. ed. Rio
de Janeiro, Imprensa Nacional, 1999.
16. FERREIRA, A.B.H. - Novo dicionário da língua
portuguesa, 3.ed. Rio de Janeiro, Ed. Nova Fronteira, 1999.
17. HOUAISS, A., VILLAR, M.S. – Dicionário Houaiss
da língua portuguesa. Rio de Janeiro, Objetiva, 2001
18. INSTITUTO BRASILEIRO DE BIBLIOGRAFIA E DOCUMENTAÇÃO
(IBBD) - Bibliografia brasileira de medicina. Rio de Janeiro, 1965-1972.
19. INSTITUTO BRASILEIRO DE INFORMAÇÃO
CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA (IBICT) - Bibliografia brasileira
de medicina. Rio de Janeiro, 1973-1979.
20. INTERNET - http://www.bireme.br.
5 de outubro de 2001.
Publicado no livro Linguagem Médica, 3a. ed., Goiânia, AB Editora e Distribuidora de Livros Ltda, 2004..
Joffre M de Rezende
Prof. Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás
Membro da Sociedade Brasileira de História da Medicina
e-mail: pedro@jmrezende.com.br
http://www.jmrezende.com.br
10/9/2004.